quinta-feira, 13 de outubro de 2022

PHOTOGRAPHIA

 


Bruno R. Sales

            Fotografia: imagem captada através de máquinas projetadas para esse fim. Essa é a mais simplista definição do que é uma foto dada por este que escreve. Entretanto, assim o fiz para ter com o quê começar esse texto. No desenrolar dessas letras espero falar mais profundamente sobre o tema.

            A mim já parece muito previsível iniciar com a etimologia da palavra – dada a importância que dou a esse aspecto, não poderia ser diferente –, desse modo, o termo fotografia tem origem grega: φῶς [fós], cuja tradução é ‘luz’ e γραφw [grafó] referindo-se ao ato de fixar por escrito. Numa ligeira junção, fotografia é a fixação da luz em forma visível. Para uma exposição mais agradável é justo ver cada parte separadamente, antes de uni-las.

 Primeiro, o que é a luz? Não vou me ater aos princípios puramente físicos da resposta à questão, mas, de modo especial, aos filosóficos.  Partindo de Descartes, “a luz não é outra coisa que certo movimento, ou uma ação muito rápida e muito viva” [1]. Em seguida, o que significa dizer ‘fixar a luz’, senão que, a foto, aos moldes de nossos olhos, capta a luz visível das coisas e as congela numa representação do tempo e espaço. Kant classificou o tempo e o espaço como categorias a priori, isso significa que eles são anteriores a qualquer experiência dos sentidos e, em função disso, indispensáveis para tal coisa. Se eu puder trocar em miúdos – e espero que sem engano – o tempo e o espaço kantianos garantem à mente humana certo conceito de realidade. Tudo que é experiência depende disso, ou melhor, tudo o que ‘é’ está dependente desse conceito. A fotografia, então, captura, numa imagem, a realidade enquadrada nos instrumentos próprios para isso; não somente, ela capta o movimento e congela-o. Entretanto, incentiva outros, em geral movimentos do espírito [no sentido filosófico].

Walter Benjamin atesta que:

Percebemos, em geral, o movimento de um homem que caminha, ainda que em grandes traços, mas nada percebemos de sua atitude na exata fração de segundo em que ele dá um passo. A fotografia nos mostra essa atitude... somente a fotografia revela esse inconsciente ótico [2].

Luz, espaço e tempo unidos formam o instante. Pergunto: o que se contempla numa fotografia? Um instante, que ao ser observado em sua captura pode-se refletir por muito tempo. Guardar o instante é o que pretendemos quando fotografamos. Captar o tempo, prender o espaço e perpetuar o sentimento do momento vivido. É por essa razão que nossas emoções agitam o espírito ao ver determinada foto.

            Na fotografia, os instantes capturados podem proceder de fontes diferentes: pessoas, paisagens, animais, obras de arte. Seja qual for sua origem, as fotos, todas elas de algum modo e em graus variados, inquietam o coração do sujeito. Por exemplo, se considerarmos a foto de alguém por quem se nutre bons sentimentos, sua imagem traz ao espírito a nostalgia de tudo que viveu-se com ela, mas, de igual modo, traz questionamentos de como ela está, como vive, etc. De outro modo, se tomar a foto de uma escultura a sua beleza poderá encantar, e outras questões, de natureza diversa das expostas acima, surgem: qual foi a inspiração do artista? Que técnica utilizou? O que sua figura representa? E por fim, corre-se ainda o risco de retomar o estado nostálgico, pois na beleza da escultura, pode-se facilmente imaginar o que certa pessoa, de quem se lembra no momento, acharia daquela imagem.

             A vida é hic et nunc [aqui e agora], e a fotografia não capta isso, pois se trata de experiência, vivência, ou seja, é o “estar ali”. Contudo, ela – a foto – produz um novo aqui e agora, que se realiza numa nova experiência vivida subjetivamente. Sendo o instante a contemplação da foto, sabe-se que ele é um passado, mas, como recorda o poeta, “o passado é o presente na lembrança” [3]. E essa lembrança é o novo e nostálgico hic et nunc vivenciado com a imagem.

 



[1] DESCARTES, René. A dióptrica. In.      . Discurso do método e ensaios. São Paulo, Editora UNESP, 2018.  p. 130

[2] BENJAMIN, Walter. Pequena história da fotografia. In.     . Magia e técnica, arte e política. Obras escolhidas vol. I. São Paulo, Brasiliense, 1994. p. 94.

[3] PESSOA, Fernando. Obra poética de Fernando Pessoa: volume I. Rio de Janeiro, Nova fronteira, 2016. E-book kindle.

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